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Jessé Souza contra o Racismo Primordial, ou: do perene ódio progressista ao Cristianismo

"É necessário demonstrar que o racismo primordial se produz primeiro em termos religiosos e depois em termos científicos, sem qualquer solução de continuidade. Estou aqui propondo uma definição ampliada de racismo que possa abranger toda forma de hierarquia construída entre ''humanos superiores'' e ''humanos inferiores''. Como o racismo racial é ''apenas'' uma das formas possíveis por meio das quais isso se constrói, é necessário que nos dediquemos a buscar as formas mais elementares, abstratas e universais que regem a gramática de toda desigualdade hierárquica"


Jessé Souza, "A Guerra contra o Brasil"


O intelectual Jessé Souza deu uma entrevista ao Globo em que inclui uma avaliação precisa da decadência da esquerda. O abraço ao identitarismo a afastou das classes populares e o futuro pós-Lula é cada vez mais problemático [para a esquerda]. A solução seria que os ditos progressistas aprendessem com Getúlio Vargas, cujo legado e memória foi atacado pelo lulopetismo por décadas e décadas.



Mas Jessé está em posição de fornecer elementos para que o problema possa ser minimamente sanado?


Nada indica, já que ele contribui para a alienação progressista com suas teses descabidas sobre o racismo. O sociólogo consegue tornar o conceito ainda mais abrangente que o de Dugin [que, na "Quarta Teoria Política", defende que qualquer ideia de progresso seja racismo]. Jessé identifica uma matriz do pensamento racista, um racismo primordial, não no pseudo-universalismo iluminista [que nada mais é que a generalização temporal e espacial do eurocentrismo], mas nas fontes intelectuais da civilização helenista, romana, cristã, europeia e ocidental.


O Racismo Primordial, diz ele, seria consequência da psicologia e antropologia platônicas, mais particularmente da hierarquia entre o espírito [o logos, a razão] e o corpo [as paixões, incluindo os desejos]. Esta distinção se tornou axial no agostinianismo, que teria acrescentado uma versão de cogito que romperia com aspectos muito importantes da psicologia aristotélica.


Pronto, a "gramática da desigualdade'' estaria pronta para espalhar o vírus do ''racismo primordial'' por civilizações inteiras ao longo de séculos de ação da Igreja Católica [e, mais tarde, pela ética protestante] e para legitimar o estranhamento entre os grupos sociais. [1]


A linha de argumentação de Jessé é adornada com muito Bourdieu e Taylor. O principal, no entanto, é que a legitimação e reprodução da desigualdade viria do platonismo vulgar, que é como Nietzsche chamava de cristianismo, e das instituições que o veiculam ao longo dos tempos. E, desse modo, ele pretende ter encontrado a chave que explica a reprodução do ''racismo estrutural'' que Sílvio Almeida teria intuído.



Racismo, nessa abordagem, nada mais é que sinônimo de ''hierarquia'', um verdadeiro ''pecado original'' na ótica progressista. A responsabilidade por toda essa falta de modernidade [ou seja, pelos obstáculos ao igualitarismo] está, para ele, na religião, como não poderia deixar de ser. E como o racismo nada mais é que do que uma forma oitocentista de desigualdade e hierarquia entre populações, já dá pra entender onde se pretende chegar.


Chega a ser risível ler Jessé criticar a ''esquerda de Oslo'' e as agendas identitárias, denunciar o afastamento do povo e a guerra cultural contra as classes populares e, então, vê-lo analisar a história por meio dessas chaves canhestras e batidas. "Médico, cura-te a ti mesmo!", eu diria. Jessé precisava aprender alguma coisa com Getúlio Vargas, que superou o repúdio à religião herdado do positivismo e de certo socialismo utópico e se aproximou do catolicismo-romano e da Doutrina Social da Igreja.


Ele voltará!


Mas não por papinho furado que tem por pano de fundo a criminalização do cristianismo e a condenação da história intelectual ocidental. Reproduzindo tendências inerentes ao progressismo desde suas origens, Jessé até começa bem. Mas não se segura e investe contra a natureza, os anjos, a beleza, o espírito, e tudo que é superior na vida e no mundo.


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[1] Jessé vê, no entanto, um potencial democratizante no protestantismo por oposição ao catolicismo-romano pelas críticas à hierarquia social medieval e pela valorização da ascese do trabalho. Evidente que ele não podia deixar de se apegar a mais este jargão do progressismo.



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