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Pontos importantes para pensar a Independência do Brasil

Para pensar a Independência do Brasil, cujo bicentenário comemoramos este ano, os seguintes pontos estão entre os mais importantes:



i. As correntes historiográficas que alegam a precedência da identidade brasileira sobre a formação do Estado independente são as correntes superiores. Existe tendência, é verdade, que defende que o brasileiro só nasce DEPOIS do Estado, o que reduziria o 7 de setembro a um acordão entre elites, quando muito. Mas esta é uma tese difícil de apoiar. Existia[m] sim identidade[s] coletiva[s] que se percebia[m] como brasileira[s];


ii. Dom João VI é tão ou mais importante para o processo de independência quanto Dom Pedro I e José Bonifácio. Ele tem de ser considerado como um dos maiores estadistas e políticos de nossa história, e o 7 de setembro deve ser considerado em uma perspectiva de média duração que se inicia em 1808;


iii. A ilustração em Portugal multiplicou o significado do termo Império. A noção tradicional lusitana implicava em um expansionismo ilimitado cujo fim era o domínio universal sob a bandeira do cristianismo e a unidade da coroa e da identidade portuguesa. No Brasil, a noção de Império se ligou à de unidade do território continental americano;


iv. O Estado imperial construído nas primeiras décadas de Independência NÃO era mera continuidade do lusitano nem da era colonial. Neste ponto, José Murilo de Carvalho e outros estão corretos. O Estado brasileiro tem de ser visto em perspectiva de mais curto prazo, criado pela engenhosidade e pela capacidade política de uma das mais hábeis elites intelectuais e políticas das Américas, e que refletiam sobre a formação do novo país a partir de um espaço privilegiado, o Rio de Janeiro, centro político cujo papel foi determinante para o sucesso do empreendimento.


v. O ponto acima nos leva a uma questão fulcral: a historiografia reflete tendências ideológicas dos pesquisadores ao se recusar a mergulhar a fundo na singularidade do processo de independência brasileiro, que implicou a interiorização da metrópole. Preferem destacar as especificidades da independência ianque porque a encaram sob ótica progressista, como se existisse um sentido político pré-definido na história e a partir do qual avaliamos posições passadas e pretéritas. O caminho para a soberania brasileira foi de imensa especificidade e ela ainda não é explorada de modo suficiente pela Academia;


vi. A manutenção da unidade territorial brasileira se deve a múltiplos fatores. E um daqueles que deveriam ser trazidos mais à luz é a diferença da formação entre a monarquia espanhola e a portuguesa. A Espanha se molda como uma monarquia compósita, uma instância de poder que era referência de diferentes corpos políticos que continuam a existir enquanto tais, e que jamais conseguiu dar uma unidade administrativa, fiscal e outras para as diferentes ‘partes do Império’ nem mesmo na Península Ibérica [vejam Perry Anderson para as limitações ferrenhas do absolutismo espanhol, que foram uma das causas de sua derrota nas guerras pela hegemonia no continente]. Portugal, pelo contrário, se molda como “Monarquia nacional”. A Coroa portuguesa estava vinculada à identidade e à nacionalidade portuguesa, e esta foi uma das marcas mais fortes de sua expansão pelos oceanos e continentes. Este senso de unidade ‘nacional’ seria herdado pelo Brasil e redimensionado em uma identidade de ”portugueses da América”;


vii. Já está mais que demonstrado, inclusive por pesquisa empírica e fortes dados de História econômica, que a América Portuguesa possuía uma sociedade vívida, diversificada e própria desde fins do século XVII, incluindo um mercado interno com flutuações independentes do internacional [não éramos só um conjunto de empresas de exportação], e elites supra-regionais imprescindíveis para o comando e o exercício do domínio no território e em sua burocracia. O Brasil tinha sua própria sociedade de ”antigo regime” nos trópicos, que embora vinculada a diversos interesses na rede atlântica lusitana, não se reduzia a ela e tinha uma lógica toda própria e inescapável.


E viva o Brasil!

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