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Foto do escritorAndré Luiz V.B.T. dos Reis

Problemas da Rússia não são nossos - o Brasil e a multipolaridade que nos interessa

A lição número 1 a ser retirada do mundo multipolar é que os problemas de uma potência X não são necessariamente os nossos problemas. E isso vale também para a Rússia.


Eis aí o resumo dos desvios de alguns movimentos [veja o vídeo] que dialogam ou tentam dialogar com o nacionalismo brasileiro, como é o caso dos duginistas. Interessa ao geopolítico russo Alexandr Dugin vender a Rússia como sendo o epicentro ideológico de um mundo utópico de multipolaridade e, ao mesmo tempo, fazer da presença dos EUA na chamada "Rimland" o grande bode expiatório para a construção de uma aliança global centrada... na própria Rússia [vide o "Movimento Russófilo"].


O grande problema do ''peixe vendido'' por Dugin é que a Rússia não tem poder relativo para tanto. O que vimos nos últimos anos demonstra isso de modo cabal. Enquanto sustentava o regime de Assad na Síria com apoio iraniano, impedindo os objetivos de Israel, do Estado Islâmico, e dos EUA, os russos podiam até pretender vender a ideia de que eram capazes de projetar poder global.


Claro que um olhar mais atento não cairia nessa ilusão, porém, ainda assim, a ilusão era mais defensável: um regime de Putin forte o suficiente para intervir no Cáucaso, no Oriente Médio, na África. Eram os tempos em que duginistas propagandeavam o interesse russo de ''defender a Amazônia" contra colonialismo ianque e francês (!!!!). O Brasil, asseguravam eles, deveria se preparar para uma guerra iminente contra a Colômbia, e seríamos ajudados, de alguma maneira, pelos russos - diziam.


A ideia, claro, é completamente esdrúxula, fora de qualquer contatocom a realidade: trata-se de algo que só poderia mesmo vingar em nichos duginistas radicais, que não têm problema nenhum em usar a América do Sul como mero aríete para causar problemas aos EUA - mesmo que isso signifique mergulhar o subcontinente no caos. Esta sempre foi uma proposta de Dugin, exposta em livros, e tem sentido - a partir de uma ótica imperialista russa. Mas, para um brasileiro e um sul-americano, não tem absolutamente sentido nenhum.


Mais uma vez, nossos interesses não são os interesses da Rússia.


Enfim, esse momento passou. O movimento desastrado de Putin na Ucrânia, decidindo invadir o país e depois se revelando incompetente para derrubar Zelensky rapidamente, expôs toda a fragilidade russa como pretendente a ser um pólo global de poder. Os russos entraram em um atoleiro sem tamanho na Ucrânia, e têm de suportar ataques diretos ao seu próprio território, e atentados terroristas em plena Moscou. Enquanto isso, retiram tropas e aceitam perder influência no Cáucaso e na Síria [vide Nagorno-Karabakh, o exclave armênio que era protegido por tropas russos e foi anexado pelo Azerbaijão, com ajuda turca].


Cristãos armênios expulsos pelo exército do Azerbaijão sendo evacuados

Rebeldes sírios celebrando a derrubada de Assad

De modo que os movimentos recentes significam que a Rússia é um poder regional em crise severa. É uma crise tão aguda que os russos, ironia suprema, tiveram de torcer para a vitória eleitoral de Trump, a fim de aliviar a pressão sobre suas fronteiras e a dependência cada vez maior em relação a China.


Claro que os duginistas mais radicais vão negar isso tudo. Para isso, criam a fantasia de que estão resistindo sozinhos à pressão de todos os exércitos e recursos da OTAN. E que ocorrências como a da Síria e do Afeganistão não passam de traições de aliados ou de responsabilidade das próprias ''vítimas'' [no caso, dos armênios ou dos sírios].


Há também um discurso de que a China ''deveria fazer mais'', como se os interesses chineses devessem ficar a reboque dos de Moscou -- que é, como expliquei acima e em outros textos, o sonho grandioso de Dugin: a Rússia como o centro da ''revolução mundial'', modelo que ele copia das primeiras fases da Guerra Fria.


Mas a China sim é hoje um poder global, não a Rússia. É a China, uma superpotência, que vai usar a Rússia segundo seus interesses, não o contrário. Isso é uma consequência lógica da correlação atual de forças, que diferente do que imagina Dugin, não se decide apenas no campo militar. O grande geopolítico em ação nessa aliança é Xi Jinping, e os policy makers do Partido Comunista Chinês.


Xi Jinping, Presidente da China
Xi Jinping, Presidente da China

Recep Tayyip Erdogan, presidente turco
Recep Tayyip Erdogan, presidente turco

A verdade é que Putin está perdendo feio, há muito tempo, para a férrea implementação do neo-otomismo turco por Erdogan. Eis aí uma potência que vem comendo pelas beiradas do declínio russo. Ironicamente, Dugin começou a criticar o presidente turco Erdogan e a Turquia quando da queda inesperada e veloz do regime de Assad. Irônico porque Dugin era um dos líderes da ''diplomacia paralela'' dos russos com os turcos. Talvez tenha sido mais um erro crasso do intelectual russo.


Alexandr Dugin ameaçando Erdogan
Alexandr Dugin ameaçando Erdogan

De resto, os brasileiros temos de considerar atentamente a importância desses movimentos, sabendo que todos eles são países amigos, e que não estamos contra ninguém, mas a favor do Brasil. Enxergar as coisas a partir do Brasil pode ser uma dificuldade monstruosa para movimentos no nosso país, quase sempre atrelados ao que acontece no Norte Geopolítico, seja EUA, França, Alemanha ou Rússia. E, em todos esses casos, trata-se desvios, ilusões de ótica e perda de tempo. O Brasil não deve estar a reboque de ninguém, nem é ''pau pra toda obra'' de gringos.


PÃO, TERRA E TRADIÇÃO!


Nem Washington nem Moscou!
Patriotismo cultural

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