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Foto do escritorUriel Araujo

Segundo atentado contra Trump e a Ucrânia: atirador é recrutador militar da extrema direita ucraniana

Traduzido e adaptado, pelo próprio autor, de "A Gunman, named Ryan Routh: Trump’s Second Would-be Assassin Linked to Ukrainian Far-right Recruiting?", publicado originalmente em inglês


O ex-presidente dos EUA Donald Trump foi mais uma vez alvo de uma tentativa de assassinato no domingo, 15 de setembro, no clube de golfe do qual é membro, na Flórida (a oeste de Palm Beach), por volta das 13h30 (horário local).



Um agente do Serviço Secreto atirou ao avistar um fuzil AK-47 na vegetação ao redor do campo de golfe, a cerca de 400 jardas de distância (cerca de 365 metros). O atirador, chamado Ryan Wesley Routh, 58 anos de idade, largou então o fuzil e conseguiu fugir, dirigindo uma SUV. Ele possuía uma luneta de rifle, uma câmera GoPro e duas mochilas. Routh foi parado por policiais em um condado vizinho e acabou sendo preso. Ainda não está claro se o próprio Routh chegou a disparar. Mais uma vez, analistas e jornalistas estão questionando como diabos o atirador conseguiu chegar tão perto de Trump - especialmente levando-se em conta que ele tem antecedentes criminais e já foi condenado anteriormente (em 2002) por posse de uma "arma de destruição em massa" (!!!). Além disso, o atirador tem contatos e conexões bem interessantes, para se dizer o mínimo.



Para começo de conversa, Routh, o autor do atentado, foi entrevistado pelo New York Times em 2023, quando descreveu seus esforços para recrutar ex-soldados do Talibã (do Afeganistão) para que lutassem na Ucrânia. Na entrevista, ele também falou sobre como ele próprio lutou na Ucrânia, tendo passado vários meses lá em 2022. Além disso, ele deu uma outra entrevista antes, em 2022, para a Newsweek da Romênia e, nela, conversou sobre suas atividades realizando recrutamento para a "Legião Internacional de Defesa Territorial da Ucrânia" (em inglês conhecida como International Legion Defense of Ukraine), uma unidade militar das Forças Terrestres Ucranianas composta por voluntários estrangeiros.



Como seria de se esperar de uma unidade dessas na Ucrânia pós-Maidan, a Legião é infestada pelo radicalismo de extrema-direita e neonazismo. O "Grupo Carélio" (em inglês conhecido como Karelian Group), por exemplo (também conhecido como Nord), é um batalhão que opera dentro da estrutura da Legião - é frequentemente acusado de nazismo. Da mesma forma, o "Corpo de Voluntários Alemão" (Deutsches Freiwilligen Korps - em inglês, conhecido como German Volunteer Corps), também ligado à Legião Internacional de Defesa Territorial da Ucrânia, é considerado um grupo extremista de direita pelo respeitado Terrorism Research and Analysis Consortium ("Consórcio de Pesquisa e Análise de Terrorismo"), tendo sido denunciado por seu uso da insígnia Wolfsangel, figura heráldica associada ao nazismo. Já o infame Corpo de Voluntários Russos (Russkiy dobrovolcheskiy korpus ou RVC - em inglês conhecido como Russian Volunteer Corps), um grupo de russos nazistas que lutam pela Ucrânia, conectado à Legião, é ligado à Unidade Militar A3449, que abrange várias unidades da Legião Internacional, todas elas subordinadas à Diretoria Principal de Inteligência do Ministério da Defesa da Ucrânia (HUR), como escreve Peter Julicher, historiador e pesquisador.




De volta ao autor do último atentado contra Trump: como mencionado, em suas operações de recrutamento, ele se movimentava em meio a ex-combatentes do Talibã e elementos da extrema-direita europeia que se voluntariaram para lutar do lado ucraniano no conflito atual: como a Newsweek noticiou, um relatório da Semafor de 2023 o cita como chefe do Centro Internacional de Voluntários na Ucrânia (IVC - em inglês, conhecido como International Volunteer Center), uma organização privada cujo objetivo é "empoderar voluntários". Ele é, portanto, um ativista radical pró-Ucrânia, que também está envolvido em atividades militares e paramilitares, tendo também publicado conteúdo extremo nas redes sociais, descrevendo o conflito na Ucrânia como a guerra final entre o bem e o mal.


Routh, que é dono de uma empresa de construção de galpões no Havaí, também apoia, de longa data, o Partido Democrata, o que faz sentido, considerando-se seu ativismo ucraniano - como já escrevi, os Democratas americanos, incluindo o ex-presidente Barack Obama, bem como Kamala Harris e a atual presidência da qual ela faz parte, têm consistentemente armado e financiado a extrema direita na Ucrânia - ou seja, as mesmas estruturas em meio às quais Routh parece atuar com bastante desenvoltura.


É interessante notar que a Legião Internacional de Defesa Territorial da Ucrânia, citada acima, e a infame Brigada Azov (bem conhecida por seu perfil consistentemente neonazista, como o Guardian descreveu já sete anos atrás) negaram ambas que o autor do último atentado contra Trump tenha qualquer conexão com essas organizações. Dado tudo o que foi dito acima, é claro que tais declarações não podem ser simplesmente aceitas sem questionamento.


Edward Snowden, o famoso ex-agente de inteligência da NSA (órgão de espionagem americano) e autor de várias denúncias e vazamentos, publicou no X - antigo Twitter - que a existência de conexões entre o atirador e as agências de inteligência norte-americanas é o cenário mais provável, e até mesmo comparou a situação ao assassinato de Kennedy, mencionando Lee Harvey Oswald, o veterano fuzileiro naval ("Marine") da Marinha dos EUA que assassinou John F. Kennedy:


“Sabemos pouco até agora, mas [com] a suposta participação pessoal e pública do atirador de Trump em atividades militares na Ucrânia, é difícil imaginar que as agências da Casa Branca de hoje possam alegar contato zero - ou alegar terem as 'mãos limpas'. Existe uma vibe meio Oswald nisso aí. O Congresso precisa ir atrás de respostas”


É claro que esse é um raciocínio que faz sentido, considerando-se tudo o que sabemos sobre o papel da CIA na Ucrânia desde o Maidan, conforme relatado em um furo de reportagem do New York Times de fevereiro de 2024.


Há apenas nove semanas, cumpre lembrar, Trump foi alvo de outra tentativa de assassinato, que permanece sem explicação até hoje e que, como escrevi, colocou o próprio Serviço Secreto sob suspeita.


Trump não é, de forma alguma, nenhum tipo de "pacificador" ou "homem da paz" (como já argumentei), entretanto seu posicionamento sobre a guerra na Ucrânia pode já ser o suficiente para desencadear reações de várias facções da comunidade de inteligência americana - estejam elas agindo "por contra própria" ("rogue") ou não. Esse cenário é ainda mais plausível se considerarmos o fato de que ainda não está claro quem tem de facto governado os Estados Unidos nos últimos dois anos (já que o quadro de saúde mental do atual presidente Joe Biden foi por bastante tempo abafado), com alguns especialistas chegando a falar em um "triunvirato", referindo-se aos conselheiros próximos de Biden, a saber, Bruce Reed, Mike Donilon e Steve Ricchetti.




Em resumo, uma segunda tentativa de assassinato contra um candidato presidencial (que também é um ex-presidente) ocorreu em apenas nove semanas, o contexto sendo uma crise política na qual é até difícil determinar quem está realmente no comando do país, com um presidente em exercício senil e uma vice-presidente fraca (que agora é a candidata do Partido Democrata). Enquanto isso, o próprio Serviço Secreto está sob investigação por conta da primeira tentativa de assassinato (de Trump) que ocorreu há cerca de dois meses, com sua diretora, desmoralizada, tendo renunciado. Nenhuma "teoria da conspiração" teria imaginado tudo isso. E isso tudo é, claro, inédito na história americana.



Uriel Araujo, PhD (antropologia) é um pesquisador com foco em conflitos internacionais e étnicos.


As opiniões expostas neste artigo não necessariamente refletem a opinião do Sol da Pátria



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