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Foto do escritorAndré Luiz V.B.T. dos Reis

Zagallo: ícone vivo da nação brasileira

Acordo e vejo Zagallo nos topics. Tremo pensando no pior. Mas é só uma horda criticando o velho lobo por ter brigado com o meia Giovanni, que atuou no Santos em meados dos anos 1990.



Cresci ouvindo horrores de Zagallo. A grande mídia o detestava, e muitos populares repetiam os jargões vindos do rádio e TV. Depois dos anos 1990, a moda foi falar mal do Pelé: que Pelé não derrubou a ditadura; que Pelé não acabou com o racismo; que Pelé não reconheceu uma filha ;que Pelé não militou a favor dos gays; que Pelé não era socialista como Maradona.


Nelson Rodrigues já tinha identificado esse viés na alma brasileira. O de certa ingratidão, como ele chamou em distante artigo publicado em 1959. Não sei se é bem ingratidão, mais parece uma reação impulsiva do vira-latismo inoculado na nossa mentalidade, e que sempre emerge pra negar mérito aos nossos heróis.


Voltando a Zagallo, diziam que ele era ''retranqueiro''. Foi a imagem que ficou, com o péssimo desempenho da seleção na Copa de 1974, quando marcamos apenas 6 gols em 7 partidas [metade deles na risível seleção do Zaire]. A mídia corporativa [corporativismo em mais de um sentido aqui] gostava de atribuir a seleção de 1970 ao grande parceiro João Saldanha.


Um absurdo completo: quando assumiu a seleção, Zagallo mudou não só a convocação, mas a escalação e, principalmente, o esquema. Saldanha, sim, era biruta: queria barrar Pelé, e pra isso inventou que o Rei do Futebol estava ficando ''cego'', tinha um problema ''de vista''. Não custa dizer que Pelé foi eleito o melhor jogador da Copa de 1970.


Foi Zagallo quem decidiu escalar Wilson Piazza de quarto-zagueiro. Meio século depois, diversos técnicos europeus acharam bonito escalar volantes na zaga pra melhorar a saída de bola. O Lobo também decidiu escalar Jairzinho e Rivelino nas pontas. Praticamente inventou o 'meia-ponta', que não jogava aberto nas extremas, mas caía pro entre-linhas [Jairzinho era ponta de lança de origem, Rivelino era meia armador]. Tostão foi a primeira versão de falso nove da história. Uma criação bastante original, em vez de fazê-lo disputar posição com Pelé, o escalou jogando como pivô na frente da área e caindo para os lados. Tostão era ponta de lança de origem e não tinha corpo algum pra trombar com zagueiros na área. Mas sua posição permitia a entrada em facão de Jairzinho, que acabou marcando gols em todos os jogos da Copa, algo nunca mais igualado. Essa manobra se tornou comum na Europa quarenta anos depois da seleção de 1970.


Quando fez tudo isto, Zagallo já era considerado um gênio, já tinha deixado seu nome na História. Era um ponta esquerda habilidoso mas não especial. O que tinha de singular era a inteligência tática. Ele recuava para acompanhar os meias adversários, e acabava se tornando um terceiro homem de meio campo. Foi sua atuação nos gramados que criou DE FATO o 4-3-3.


Então, anotem aí: Zagallo criou o 4-3-3 como jogador, e criou uma penca de novidades significativas na espetacular seleção de 1970, não por acaso considerada pela maioria dos analistas como a maior já montada.


Mas a mídia corporativa preferia dizer que o cérebro da seleção de 1970 era Gérson, que nunca foi treinador de nada na vida. Ou Saldanha, o ''gênio'' que queria barrar Pelé. Riam de Zagallo quando ele dizia em 1998 estar inventando um novo sistema tático, o 4-3-1-2. Mas é porque não entendiam que era justamente esdta a discussão vigente então na Europa, a ressurreição do ponta-de-lança.


Zagallo é o único homem a levantar quatro Copas do Mundo. É um ícone vivo, um monumento da nação, uma glória do país. Sempre foi ufanista, como o povo é ufanista.


Mas estão discutindo sua briga com Giovanni, como se houvesse qualquer comparação possível ou imaginável entre os dois nomes. Giovanni quem?

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